Trabalhar ou Viver?
“Viver para trabalhar”, em vez de trabalhar para viver, é uma missão assumida de forma mais ou menos explícita por muitas pessoas. A relação com o trabalho marca a forma de estar das gerações, e influencia e é influenciada pelos valores pessoais e por papéis sociais.
Se, há cem anos, era comum as pessoas herdarem os negócios das gerações anteriores, terem a sua fonte de rendimento automaticamente definida desde cedo e trabalharem no seio familiar, actualmente a escolha de uma especialização académica e de uma carreira é um percurso cada vez mais individual e identitário. Quando nos apresentamos a alguém, a nossa profissão surge, quase inevitavelmente, nas primeiras frases.
Para além disso, enfrentamos longas horas a trabalhar, a que se adicionam demoradas deslocações de e para o local de trabalho. Quando chegamos a casa, raramente estamos livres: os smartphones, com as chamadas, as mensagens e os e-mails, lembram-nos do que ficou por fazer, e antecipam o dia seguinte.
No livro “A Sociedade do Cansaço” (1), o filósofo Byung-Chul Han argumenta que a sociedade moderna, invadida pela busca incessante de realização e sucesso, e sob uma pressão constante para se ser produtivo, se encontra em constante exposição a estímulos e em sobrecarga mental, o que conduz à exaustão e ao burnout.
Nos últimos anos, têm-se escrito muitas linhas sobre a relação das gerações mais jovens com o trabalho. Depois da “Great Resignation”, onda de demissões no período pós-pandémico, veio o “quiet quitting” ou “despedimento silencioso”, em que as pessoas permanecem no seu trabalho, produzindo o mínimo possível. Em 2023, um inquérito realizado pelo Laboratório Português dos Ambientes de Trabalho Saudáveis denunciava que mais de metade dos trabalhadores portugueses estava em elevado risco de burnout. (2) Se procurarmos o termo num repositório de jornais médicos, vemos que tem sido mencionado em cada vez mais trabalhos científicos, e que os títulos especificam cada vez mais profissões de risco, incluindo os próprios profissionais de saúde e investigadores científicos. No entanto, os sinais e sintomas de burnout são frequentemente atribuídos a outros diagnósticos, e a sua identificação tardia adia a inevitável confrontação da pessoa com o repensar da sua relação com o trabalho, e a instituição de medidas terapêuticas adequadas.
Neste artigo, vamos discutir:
- O que é o burnout;
- Quais os principais sintomas;
- Porque é que as pessoas entram em burnout;
- Quais são as consequências;
- Como prevenir e tratar o burnout.
O que é o burnout?
O burnout é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sinais e sintomas, que surge como resultado do stress crónico no local de trabalho, que não pôde ser gerido de forma adequada. O burnout envolve três grupos de sintomas fundamentais (3):
– Exaustão emocional;
– Cinismo / Despersonalização / Desligamento;
– Sensação de ineficácia profissional.
A Organização Mundial de Saúde considera, assim, o burnout um fenómeno ocupacional, e não como uma doença, apesar de o burnout poder trazer, como veremos adiante, consequências importantes para a saúde.(3) Este termo não deve, igualmente, ser aplicado para descrever experiências em outras áreas da vida (por exemplo, relações interpessoais, ou papéis/funções em áreas não profissionais).
Deste modo, o burnout é um conceito contextual, no sentido em que não se foca apenas na resposta ao stress, mas aborda, de forma mais abrangente, a relação das pessoas com o trabalho em termos emocionais e interpessoais, o valor que atribuem ao trabalho e a motivação para o desempenhar.
Por vezes, pode haver períodos difíceis em termos laborais, como quando há uma mudança na organização ou no volume do trabalho, ou alteração da equipa ou das funções desempenhadas, que podem originar necessidades de ajustamento temporárias. Nestas alturas, os trabalhadores podem ter alguns sintomas de ansiedade ou sentirem-se mais cansados. No entanto, estes sintomas são habitualmente transitórios, dissipando-se gradualmente quando os problemas se resolvem, e as pessoas conseguem localizar no tempo o início e o fim desta altura mais difícil. Em contraste, as pessoas em burnout sentem que vivem uma vida que classificam como geradora de stress ou cansativa há vários anos, muitas vezes sem terem noção do grau de pressão a que estão sujeitas. Muitas vezes, há um evento que pode parecer relativamente insignificante – frequentemente um conflito, a dificuldade em relaxar durante as férias, ou a recuperação de um período de doença – que constitui “a gota de água” e que põe a descoberto os sintomas, podendo precipitar uma percepção avassaladora, para o próprio, do seu estado de saúde.(4)
Quais são os principais sintomas do burnout?
Habitualmente, as pessoas saudáveis regulam os níveis de esforço que dispendem nas tarefas quando se sentem mais cansadas. Tal não parece acontecer nas pessoas nas fases iniciais do burnout, que perseveram e tentam manter altos níveis de exigência nas tarefas. Após a manutenção de estados de stress elevados durante longos períodos, e sem obter resultados, a pessoa sente-se desmotivada e distante e pode assumir uma atitude passiva.
Os estudos realizados em pessoas com burnout têm permitido fazer uma reconstrução do que acontece neste processo, distinguindo várias fases, que podem, no entanto, sofrer variações individuais, ou sobrepor-se (4):
Fase 1 – Ausência de recuperação
O nosso organismo está preparado para ultrapassar períodos de stress, se estes forem intercalados com outros de descanso e recuperação. Se este descanso não for possível, as pessoas começam a notar níveis superiores de cansaço. Nesta fase, podem ainda tentar proteger-se e evitar esforços adicionais.
Fase 2 – Alteração da resposta ao stress
Se o stress for continuado, o organismo ajusta o estado basal para níveis de resposta ao stress mais elevados (5), o que pode resultar em hipervigilância, inquietação e sensação de tensão permanente. A pessoa sente que não consegue relaxar ou descansar, mesmo quando não está no trabalho. Adicionam-se as dificuldades no sono que, por sua vez, agravam o cansaço e dificultam a recuperação.
Fase 3 – Sintomas de stress crónico
Para além de poderem ocorrer sintomas típicos das fases anteriores, outros sinais e sintomas que frequentemente surgem associados ao stress crónico incluem (4,6):
- dificuldades de regulação emocional como instabilidade emocional, reacções emocionais intensas ou sensação de falta de controlo sobre as emoções. O stress crónico pode provocar, ainda, maior irritabilidade e conflituosidade, que se repercute na vida pessoal;
- abandono de rotinas de exercício físico ou passatempos;
- dificuldades cognitivas, nomeadamente (7):
- dificuldade em tomar decisões e resolver problemas;
- dificuldades de concentração;
- esquecimentos frequentes;
- dificuldade em pensar de forma flexível, e em ser-se criativo e empático;
- incapacidade de reflectir sobre si próprio e sobre as suas dificuldades.
- sintomas físicos, como:
- palpitações;
- sensação de aperto no peito;
- queixas gastro-intestinais;
- tensão muscular;
- dores de cabeça;
- sinais de supressão do sistema imunitário, como adoecer frequentemente.
Fase 4 – Desmotivação e desesperança
Progressivamente, vão-se instalando os sintomas fundamentais do burnout:
Exaustão ou sensação de perda de energia
No burnout, há a sensação de se ter atingido o limite em termos de cansaço e de já não se dispor de mais energia emocional ou física. As pessoas sentem-se drenadas e sentem que não há nada que ajude a repor as reservas de energia perdidas. É comum ter-se a sensação de que não se vai tolerar mais um único dia no trabalho, ou de que não se vai conseguir responder a nem mais um pedido. Esta é a dimensão do burnout que diz mais respeito à experiência da pessoa em si, e menos relacionada com o trabalho.
Aumento da distância mental em relação ao trabalho
Esta distância pode estender-se a sentimentos de negatividade ou cinismo, e marca uma atitude negativa, hostil ou excessivamente desligada em relação ao trabalho. Habitualmente, esta distância constrói-se como uma defesa, para proteger o próprio da sensação de cansaço. No entanto, levada ao extremo, pode ter como consequência a desumanização das pessoas envolvidas. O cinismo constitui a dimensão interpessoal do burnout.
Sensação de ineficácia e falta de realização
Esta sensação advém da percepção de que se é menos produtivo e, consequentemente, menos competente e adequado no trabalho, aumentando a sensação de falhanço.
Assim, as pessoas com burnout não se sentem apenas cansadas ou fartas do seu trabalho: experienciam uma sensação de distanciamento emocional que tem um forte impacto na sua motivação e, até, na sua identidade. Esta síndrome é muitas vezes descrita em grupos profissionais em que a função de cuidar, ou a sensação de missão, estão muito presentes, o que faz com que este distanciamento emocional seja muito difícil de aceitar, podendo gerar uma sensação de vazio, ou estar associado a fortes sentimentos de culpa.
Como perceber se estou em burnout?
Algumas questões que pode fazer para perceber se é provável que esteja em burnout incluem (8,9):
- Sinto-me fisicamente/mentalmente exausto no trabalho?
- Sinto que tudo é muito difícil?
- Quando me esforço, sinto que atinjo o meu limite muito rapidamente?
- No final do dia, sinto que é muito difícil recuperar a energia gasta?
- Sinto pouca satisfação no que consigo realizar?
- Sinto-me em “piloto automático”?
- Duvido das minhas capacidades?
- Baixei o meu grau de exigência relativamente aos resultados?
- Sinto-me distante do meu trabalho e dos meus colegas?
- Sinto-me descrente em relação ao significado do meu trabalho para os outros?
- Sinto que já não tenho paciência para colegas ou clientes?
- Irrito-me facilmente, principalmente quando as coisas não correm como esperava?
- Sinto-me incapaz de controlar as minhas emoções enquanto trabalho?
- Não me reconheço nas minhas reacções?
Porque é que as pessoas entram em burnout?
Dado que o problema central no burnout é a relação com o trabalho, têm sido investigadas causas inerentes aos dois pólos dessa relação, ou seja: características pessoais e características do trabalho. Os factores pessoais parecem ter menor peso, enquanto que as características do trabalho e do ambiente de trabalho, as relações interpessoais (com colegas, clientes ou supervisores), o equilíbrio de recompensas e os valores associados ao trabalho são o cerne do burnout (10).
Factores pessoais
As pessoas mais velhas têm menor risco; no entanto, tal pode estar associado ao aumento da experiência profissional, ou a um “viés de sobrevivência”: as pessoas que são capazes de tolerar níveis mais elevados de exigência mantêm-se durante mais tempo no mercado de trabalho (10).
Alguns estudos têm também apontado diferenças de acordo com o género: os homens são mais propensos a manifestar o burnout através do cinismo, mas as mulheres parecem ter, globalmente, maior risco. Tal pode estar relacionado com o tipo de trabalho frequentemente realizado pelas mulheres, que envolve sectores como a educação e a saúde, que estão cronicamente sobrecarregados e com falta de recursos, e em que a função de cuidar está mais presente (11). Também a menor probabilidade de serem promovidas, e ocuparem posições de menor poder e maior vulnerabilidade, aumenta o burnout (12). Para além disso, as mulheres têm tendencialmente mais exigências no trabalho doméstico (13), o que aumenta a carga laboral total, tensão entre as várias áreas da vida e diminui o tempo disponível para descansarem.
As pessoas com traços de personalidade de maior neuroticismo (com maior tendência para antecipar eventos negativos, percepcionar o mundo como ameaçador e sentir menor controlo sobre possíveis ameaças) têm maior risco de burnout. Ironicamente, as pessoas com maior perseverança têm maior tendência a suportar o stress crónico, mantendo-se numa situação desvantajosa e acumulando sintomas sem pedir ajuda, e as pessoas mais competitivas e ambiciosas podem ter maior tendência à exaustão associada ao burnout (4).
Características do trabalho
As principais características do trabalho que aumentam o risco de burnout são (4, 14):
- Elevado número de horas de trabalho, ou períodos longos de trabalho contínuo;
- Sobrecarga de trabalho:
- qualitativa, com aumento marcado da exigência das funções,
- quantitativa, com elevado número de tarefas, que conduz a uma diminuição da capacidade de a pessoa desempenhar o seu trabalho, diminuição da sensação de eficácia e limitação da capacidade de a pessoa descansar e se restabelecer;
- Alternância entre períodos de elevada carga de trabalho e exigència, e períodos “vazios” de trabalho, em que pode ser difícil encontrar motivação e significado;
- Falta de clareza relativamente ao que é esperado da função;
- Ter funções múltiplas, que podem colidir entre si;
- Profissões com papel de cuidador: profissões com elevado envolvimento emocional e elevada responsabilidade pelo bem-estar de outros, como é o caso dos profissionais de saúde e educadores, têm maior risco de exaustão emocional e burnout;
- Sensação de falta de controlo sobre o trabalho:
- não ter um papel nas decisões que são tomadas;
- não decidir o volume de trabalho que consegue abarcar;
- ter prazos impostos e inflexíveis ou impraticáveis;
- não ter os meios necessários para cumprir as tarefas de forma adequada;
- Baixa recompensa: tanto a ausência de recompensas práticas e financeiras, como a falta de feedback e encorajamento das chefias e colegas, e mesmo o baixo reconhecimento social da profissão, são factores de risco para burnout.
- Ambiente de trabalho marcado por conflitos não resolvidos, agressões, e fraco suporte interpessoal;
- Falta de justiça e equidade no trabalho: os desequilíbrios nas recompensas e na forma de tratamento no local de trabalho aumentam a sensação de falta de controlo, diminuem a satisfação das pessoas e afectam gravemente o sentido de comunidade, prejudicando os relacionamentos interpessoais. Se as pessoas sentirem que não são tratadas de forma respeitosa e justa, podem surgir sentimentos de cinismo, zanga e hostilidade.
- Incongruência de valores: a incongruência entre as ideias e motivações das pessoas e as da sua organização ou empresa corrói a ligação entre o trabalhador e o empregador. As pessoas acabam por se sentir divididas entre o trabalho que querem fazer e aquele que têm de fazer, e têm mais dificuldade em encontrar significado.
Baixa satisfação com o equilíbrio entre vida pessoal e trabalho
A sensação de que o trabalho rouba tanta energia e tempo que resta pouco para nós, para a nossa família e amigos e para a nossa vida, aumenta de forma significativa a tensão com o trabalho. Globalmente, as características pessoais devem ser pesadas com as exigências de trabalho, e deve considerar-se qual é o grau de encaixe da pessoa tanto com as funções desempenhadas como com a estrutura organizacional e com o ambiente do trabalho (15).
Quais são as consequências do burnout?
O burnout traz custos importantes para a saúde mental e física, e para a capacidade de trabalho.
Saúde mental
O burnout aumenta o risco de abuso de substâncias (16), nomeadamente, mas não exclusivamente, de álcool, e aumenta o risco do desenvolvimento de doença mental, nomeadamente quadros de ansiedade e depressão (17).
Tem sido discutido se o burnout constitui uma doença mental em si mesmo, ou se é mais adequado considerá-lo um desencadeante para doença mental, particularmente para quadros de ansiedade e depressão. A actual evidência científica tem-se focado principalmente na distinção entre burnout e depressão, e indica que são, de facto, entidades diferentes (18): o burnout relaciona-se exclusivamente com o trabalho, enquanto que a depressão é independente do contexto. No burnout, há habitualmente uma melhoria dos sintomas com o afastamento do local de trabalho, o que não acontece na depressão, e as pessoas podem identificar com maior facilidade que o trabalho é a fonte dos seus sintomas, em vez de atribuírem a si próprias a culpa, o que é mais frequente na depressão. A perda de prazer nas actividades de que dantes gostavam, e a perda da reacção a eventos positivos, são em regra mais acentuadas na depressão. As pessoas com depressão têm ainda, com maior frequência, história familiar desta doença.
Parece haver uma relação bidireccional entre burnout e depressão, em que cada um potencia o desenvolvimento do outro. Nos casos em que os problemas no trabalho constituem um factor contributivo para a depressão, o burnout medeia esta associação, ou seja: experienciar burnout é um passo para o desenvolvimento de sintomas depressivos (16).
Saúde física
A exaustão é a dimensão do burnout que se aproxima mais das consequências já conhecidas do stress crónico, e como tal é a que prevê de forma mais fiável as consequências a longo prazo para a saúde da pessoa. A exaustão pode associar-se a outros sintomas de stress crónico, como dores de cabeça, tensão muscular, fadiga crónica ou alterações gastro-intestinais. O burnout aumenta o risco de hipertensão arterial e diabetes mellitus, e aumenta globalmente o risco cardiovascular (16,17), o que parece dever-se a um aumento da inflamação (19). Pode ainda estar associado a sinais de supressão do sistema imunitário, como infecções frequentes (4).
Por último, o burnout aumenta o risco de acidentes de trabalho, com potenciais consequências para a saúde pessoal (20).
Capacidade de trabalho
O burnout afecta negativamente a satisfação da pessoa com o trabalho, pelo que pode reduzir o investimento pessoal no trabalho e na empresa, provocar uma diminuição da produtividade e da eficácia no trabalho e aumentar o absentismo. Conduz, para além disso, a um incremento das demissões e da frequência com que os trabalhadores de uma empresa mudam (aumenta o “turnover”) (4).
As pessoas com burnout podem também ter um impacto negativo na dinâmica do trabalho, quer por perturbarem a progressão de tarefas, quer através do aumento de conflitos com os colegas, no trabalho. O burnout pode, assim, ser “contagioso”, perpetuando interacções nocivas (21,22).
Como prevenir e tratar o burnout
Nos quadros de burnout, é essencial uma avaliação e tratamento multidisciplinar, nomeadamente por um psiquiatra e psicólogo, que coordenam uma intervenção centrada na remodelação de factores de estilo de vida e em intervenções psicoterapêuticas. À Psiquiatria, pode ainda caber uma intervenção farmacológica direccionada ao tratamento transitório de alguns sintomas, como as alterações do sono ou a desregulação emocional, e ao tratamento de sintomas de ansiedade e depressão.
As intervenções para a prevenção e tratamento do burnout podem envolver a pessoa, o grupo de trabalho, ou a empresa/organização como um todo. De facto, uma revisão de estudos científicos documentou benefícios de programas de prevenção do burnout focados em factores pessoais – melhoria da gestão de stress, aumento da confiança no trabalho e melhoria do suporte social – e na reorganização do fluxo de trabalho, com aumento do controlo dos trabalhadores (4).
Se tem ou já teve sintomas de burnout, ou se simplesmente deseja manter uma relação mais saudável com o trabalho, estas são algumas medidas que pode considerar para recuperar dos sintomas e reconstruir a sua relação com o trabalho de uma forma mais saudável (6):
Pesar o significado do trabalho na sua vida
Quais são os seus valores e objectivos pessoais? Por que outros aspectos da sua vida passa a sua realização pessoal? Quanto espaço é que o trabalho ocupa na sua vida? Esse espaço é proporcional à satisfação que o trabalho lhe traz? Faça a si próprio a clássica pergunta das entrevistas “onde gostava de estar daqui a 5 anos?”, mas pense nas outras dimensões da sua vida.
Avaliar o seu padrão de trabalho
Acumula volumes elevados de trabalho? Divide-se por várias tarefas? Trabalha a um ritmo muito elevado? Não faz pausas? Leva trabalho para casa? Olhe para a sua lista de tarefas e pense no que acharia razoável outra pessoa fazer. Faça ajustes pensando a longo prazo e de forma realista.
Avaliar as suas opções no trabalho
Identificar que aspectos de organização do seu trabalho ou que tipo de tarefas lhe causam mais sobrecarga ou cansaço, e discutir, com as chefias potenciais mudanças, pode aumentar a sua eficácia e reduzir os sintomas de burnout. Estabeleça linhas temporais claras, em que espera que estas mudanças sejam concretizadas. Se houver pouca flexibilidade para fazer estas mudanças, poderá equacionar, se lhe for possível, mudar de trabalho, em direcção a um contexto laboral mais alinhado com o seu estilo de vida, valores e objectivos pessoais.
Estabelecer limites
Quando estamos cansados, podemos ter dificuldade em parar e pensar, e podemos acabar por acumular trabalho por acreditarmos que é mais fácil fazer mais um esforço do que negociar ou discutir. Aprender a dizer “não” quando não temos a certeza de conseguir, delegar tarefas ou recusar trabalho são capacidades importantes para si, pessoalmente, e para a organização do seu trabalho.
Respeitar o horário de trabalho
O que inclui desligar qualquer contacto que tenha com o trabalho, como e-mail ou chamadas, fora deste horário. Não se esqueça de respeitar os descansos no fim-de-semana, feriados e férias. Evite também contactar os colegas de trabalho nestes horários.
Agendar as tarefas pessoais e hobbies
Crie compromissos consigo próprio ou com outras pessoas, registe-os na sua agenda e leve-os tão a sério como os do trabalho.
Adoptar estratégias de relaxamento e mindfulness
Algumas estratégias de relaxamento simples, como as baseadas na respiração, podem ser facilmente incorporadas no dia-a-dia e utilizadas no local de trabalho. O mindfulness promove o foco no momento presente e pode ajudar a evitar a antecipação e a sensação de sobrecarga.
Procurar o apoio de pessoas próximas
Procure o apoio de família e amigos para “recarregar baterias”, e para manter presente que há outros aspectos da sua vida, para além do trabalho, que são importantes.
Manter rotinas saudáveis
A manutenção de um programa de exercício físico regular, de hábitos alimentares saudáveis, e o respeito pelas necessidades de sono individuais são essenciais para a gestão do stress, para a função cognitiva, e para a promoção do bem-estar e prevenção de doenças mentais e físicas.
A recuperação do burnout é habitualmente progressiva, mas longa (23). Alguns sintomas cognitivos, particularmente as dificuldades de memória, podem arrastar-se durante mais de um ano (24). Valorize os pequenos ganhos, e mantenha o foco nos seus objectivos.
Regressando ao livro de Byung-Chul Han, de que falámos na introdução, é importante ter momentos de contemplação, centrar-se no presente e no que já alcançou. Só assim conseguirá perceber, genuinamente, o que falta, e redefinir o que, para si, significa ter sucesso, e evitar sacrificar o seu bem-estar por expectativas que não são verdadeiramente suas.
Referências bibliográficas:
- Han BC. Sociedade do cansaço. Editora Vozes Limitada; 2015 Nov 26.
- Burnout: metade dos trabalhadores portugueses sentem-se exaustos, tristes, irritáveis, à beira do colapso [Internet]. Expresso. 2023. Disponível em: https://expresso.pt/sociedade/2023-05-15-Burnout-metade-dos-trabalhadores-portugueses-sentem-se-exaustos-tristes-irritaveis-a-beira-do-colapso-90bb3b6b
- World Health Organization. Burn-out an “occupational phenomenon”: International classification of diseases [Internet]. World Health Organization. 2019. Disponível em: https://www.who.int/news/item/28-05-2019-burn-out-an-occupational-phenomenon-international-classification-of-diseases
- Van Dam A. A clinical perspective on burnout: diagnosis, classification, and treatment of clinical burnout. European journal of work and organizational psychology. 2021 Sep 3;30(5):732-41.
- McEwen BS. Neurobiological and systemic effects of chronic stress. Chronic stress. 2017: 2470547017692328.
- Patterson C. How to recognise the warning signs of burn out [Internet]. The British Medical Association is the trade union and professional body for doctors in the UK. 2020. Disponível em: https://www.bma.org.uk/news-and-opinion/how-to-recognise-the-warning-signs-of-burn-out
- Michailidis E, Banks AP. The relationship between burnout and risk-taking in workplace decision-making and decision-making style. Work and Stress. 2016 30 (3): 278–292
- Mayo Clinic Staff. Know the signs of job burnout [Internet]. Mayo Clinic. 2023. Disponível em: https://www.mayoclinic.org/healthy-lifestyle/adult-health/in-depth/burnout/art-20046642
- Schaufeli WB, Desart S, De Witte H. Burnout Assessment Tool (BAT)-Development, Validity, and Reliability. Int J Environ Res Public Health. 2020 Dec 18;17(24):9495
- Fink G. Stress : concepts, cognition, emotion, and behavior. London, Uk: Academic Press, An Imprint Of Elsevier; 2016.
- Dugan E. People at increased risk of burnout due to more demanding workdays, TUC says. The Guardian [Internet]. 2023 Jul 23; Disponível em: https://www.theguardian.com/society/2023/jul/23/people-at-increased-risk-of-burnout-due-to-more-demanding-workdays-tuc-says
- Kohler L. Why Women Are Being Left Out Of The Promotion Conversation [Internet]. Forbes. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/lindsaykohler/2023/05/25/why-women-are-being-left-out-of-the-promotion-conversation/
- Lusa. Entre tarefas pagas e não pagas, mulheres trabalham mais uma hora e 13 minutos do que os homens [Internet]. PÚBLICO. 2021. Disponível em: https://www.publico.pt/2021/03/04/impar/noticia/tarefas-pagas-nao-pagas-mulheres-trabalham-hora-13-minutos-homens-1953096
- Wilson S. Avoid the Burn [Internet]. Apa.org. 2021. Disponível em: https://www.apa.org/gradpsych/2011/03/corner
- Leiter MP, Maslach C. A mediation model of job burnout. Em: Antoniou ASG, Cooper CL, eds. Research Companion to Organizational Health Psychology. Cheltenham: Edward Elgar; 2005: 544–564
- Toppinen-Tanner S, Ahola K, Koskinen A, Väänänen A. Burnout predicts hospitalization for mental and cardiovascular disorders: 10-year prospective results from industrial sector. Stress Health. 2009;25:287–296
- Ahola K, Hakanen J. Burnout and health. Em: Leiter MP, Bakker AB, Maslach C, eds. Burnout at Work: A Psychological Perspective. London: Psychology Press; 2014:10–31
- Parker G, Tavella G. Distinguishing burnout from clinical depression: A theoretical differentiation template. J Affect Disord. 2021 Feb 15;281:168-173
- Toker S, Shirom A, Shapira I, Berliner S, Melamed S. The association between burnout, depression, anxiety, and inflammation biomarkers: C-reactive protein and fibrinogen in men and women. J Occup Health Psychol. 2005;10:344–362
- Nahrgang JD , Morgeson FP, Hofmann DA. Safety at work: a meta-analytic investigation of the link between job demands, job resources, burnout, engagement, and safety outcomes. J Appl Psychol; 2011 (96): 71–94
- Bakker AB, Le Blanc PM, Schaufeli WB. Burnout contagion among intensive care nurses. J Adv Nurs. 2005;51:276–287.
- González-Morales M, Peiró JM, Rodríguez I, Bliese PD. Perceived collective burnout: a multilevel explanation of burnout. Anxiety Stress Coping. 2012;25:43–61
- Eskildsen A., Andersen LP, Pedersen AD, Andersen JH. Cognitive impairments in former patients with work-related stress complaints–one year later. Stress (2016), 19(6), 559–566
- Dalgaard VL, Hviid Andersen J, Pedersen AD, Andersen LP, Eskildsen A. Cognitive impairments and recovery in patients with work-related stress complaints – four years later. Stress. 2021 May;24(3):294-302